sábado, 9 de abril de 2011

Amar é o melhor remédio!

Amar é o melhor remédio!
Escrito por Anne Crystie (voluntária do Projeto Integrar).














Nos últimos meses, o meu futuro profissional tem-me oportunizado questionar aquilo que muitos chamam de amor. É! Amor. A importância dos vínculos e conexões, o mistério do estar-com, a magnitude da interpessoalidade: o que de bom podemos colher caso apertemos as mãos uns aos outros? 

Os benefícios de estar junto, ao que me parece, estão para além de simplesmente não estar só. Sim, porque não saber da solidão já é uma benfeitoria digna de si mesma. Mas ter com o outro, com o eu que é ele, ou com o nós, é capaz de amenizar os mais variados sintomas. Falo isto em nome de mim própria. Não acumulei dados ou fiz pessoas serem odiadas para que o amor provocasse uma cura: eu tomei dois comprimidos no café da manhã na última feira!

Vivemos de cestas fartas de bulas que sintomatologizam as nossas faltas (de ânimo, de tempo, de apetite) e excessos (de sal na comida, de álcool no fim de semana, de força braçal no trabalho). Uma aspirina depois do almoço, dois daqueles verdes no jantar, o da tarja preta antes de dormir: “remédios, para que te quero?”

Longe de mim viver sem eles! Ainda há pouco engoli alguns “benegripes” para afastar o frio dos pés. O que quero dizer é: tenha sempre em casa uma caixa de amor com um bom prazo de validade. Compre-a nas ruas, nas calçadas, nos olhares... Mas compre-a! Coloque-a na cesta de natal, na ceia de ano novo, na cabeceira da cama nos dias de ressaca do carnaval. Deixe que o amor resignifique, ou mesmo signifique, as dores que você tem nas pernas, o cansaço que sente nos braços, a dificuldade que traz nos olhos... Deixe o amor entrar! Bem clichê mesmo.

Grandes nomes, que faziam todo mês as compras do supermercado como nós, ousaram inscrever diante das ciências, das religiões e filosofias a importância do toque na promoção da saúde. Quanto da sua febre decresceria caso lhe fizessem uma massagem nas mãos? Acordaria menos resfriado se dormisse de conchinha? Seria capaz de voltar a correr no quarteirão depois duma boa e atenciosa conversa?

Muitas de nossas dores de cabeça são respostas à importância que não damos ao contanto com o outro. A depressão, que já passou por mal-do-século algumas vezes, é sinônimo de solidão, de vazio de sentido, de desespero diante do nada. É que nós precisamos estar preenchidos o tempo inteiro! Repletos de instantes, lembranças, metas... Aproveitando o natal, o quintal, o portal, e tudo mais que ao coração possa servir de antibiótico.

Os encapsulados ou os efervescentes?! Nem me importa. Depois que me afetei perdidamente com o bem que este comprimidinho me faz, quero retalhos ou cartelas, mas quero amar e ser amada! Quero verdadeiramente viver a desordem ao dormir trinta minutos mais tarde e atrasar-me dois palitos para os afazeres diários, mas quero tomar o meu remédio na hora certa! Checar todas as minhas receitas e até comprar uma daquelas caixinhas (douradas, pequenas, de música) para nunca esquecer onde pus a banda que sobrou da dosagem de ontem.

O amor está à prova de todo e qualquer sentido! Precisa-se dele nos bairros mais afastados e esquecidos da cidade; nos lares onde com sinal pouco nítido a rádio chega; nos leitos de hospital cheios de esperança; nas escadarias de mãos estendidas; em cima e atrás dos trios elétricos; nas justas e injustas e enchidas penitenciárias; nas filas na chuva ou no sol dos postos de saúde; nas salas de aula barulhentas e silenciosas; na sua geladeira descongelando; no coração dos seus amigos e irmãos.

Lembram-se daquela vacina que nos marcou no braço direito, quando ainda recém-chegados ao mundo? É sobre isso que os escrevo: sobre a importância dos vínculos e conexões, o mistério do estar-com, a magnitude da interpessoalidade. Os frutos, grandes, suculentos e maduros que um aperto de mão faz brotar em nossas árvores são como os anticorpos que a “BCG” faz morar em nosso corpo! São a cura que alguns esperam e a saúde que todos ansiamos.

O autocuidado e a promoção da saúde requerem mais que o efeito dos carimbos de hospital e da coleção de caixas medicinais que guardamos no armário da cozinha. (...) E o amor é isto que falta! Toquemo-nos uns aos outros; pouco importa se em 250 ou 500mg, mas sintamo-nos. Deixemos que a potencialidade curativa da substância química “amar” reaja perante nossas células doloridas, provocando uma anestesia consciente. Estejamos bem: com o mundo (com o outro) e com o nosso corpo (com nós mesmos)!

(...) Alexander Lowen, médico psiquiatra e psicoterapeuta norte-americano, após dizer que “quanto mais vivo for o seu corpo, mais vivamente você estará no mundo”, legou-nos que: “Se alguém deseja viver mais plena e ricamente, deve abrir seu coração para a vida e para o amor. Sem amor a si próprio, aos demais, à natureza e ao universo, o indivíduo é frio, alienado e desanimado. Dos nossos corações flui o calor que nos une ao mundo em que vivemos. Essa quentura é o sentimento de amor.” Sejamos, pois, quentes, vivos e saudáveis!

Texto publicado no Jornal Página Revistaem Dezembro de 2010.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Uma etiologia Psicossomática para a Hipertensão Arterial

Inúmeros estudos pontuam aspectos psicossomáticos da hipertensão (Lowen, 1977; Mac Fadden e Ribeiro, 1998; Mello Filho, 2002; Couto, 2003; Czeresnia, 2007), reforçando elementos emocionais, estrutura de caráter e hábitos cotidianos que favorecem o agravo e manutenção de quadros crônicos da doença.

Alguns destes estudos ressaltam a importância dos aspectos emocionais e relacionados ao stress, para os cuidados com a hipertensão arterial (Mac Fadden e Ribeiro, 1998; Mello Filho, 2002; Silva, 2008). Eles apontam aspectos da personalidade, hábitos comportamentais e grupais, indicando que os sujeitos hipertensos apresentam dificuldades em externalizar emoções mais intensas e costumam acumular enorme carga emocional, ocasionando grandes níveis de tensão. Vive-se constantemente sob “pressão”, mesmo em situações cotidianas que habitualmente não ofertariam perigo.

Sentimentos de hostilidade, ansiedade, agressão e ressentimento habitam uma subjetividade insegura, onde a sensação de ameaça no ambiente é uma constante, ensejando um conflito básico entre hostilidade e inibição. Esta condição atua ora na gênese da doença, ora como agravante e desencadeador da hipertensão (Mac Fadden e Ribeiro, 1998; Mello Filho, 2002; Silva, 2008).

Doenças Crônicas: Em busca de alternativas terapêuticas!

Vários documentos políticos e técnicos internacionais atestam que vivemos uma crise mundial de saúde. Um exemplo é a Carta dos Povos pela Saúde (2000), fruto de uma Assembléia internacional envolvendo a população de todos os continentes do globo, que explicita a crise mundial através das desigualdades sociais, das práticas políticas injustas e da manutenção das relações de poder e dependência entre as nações, com a saúde sendo tratada como um bem comercial.

Pesquisa do IBGE acerca de doenças crônicas
para o ano de 2008.
Relatórios da Organização Panamericana de Saúde (OPAS) e da Organização Mundial de Saúde (OMS) (2005, 2007) atestam que nunca houve antes no mundo tantos pacientes portadores de doenças crônicas e a estimativa para 2015 é que esta proporção aumente mais ainda. Mais de 60% de todas as mortes em nosso país são relacionadas a doenças crônicas. Aqui o número de mortes estimadas em 2005 de vítimas de doenças crônicas foi de 1.289.000. Até 2015 o país registrará um aumento de 82% de mortes por diabetes. A OMS estima que o Brasil perde cerca de 3 bilhões de dólares ao ano de toda a sua produção nacional devido a mortes prematuras por doenças do coração, acidente vascular cerebral e diabetes.

Tais enfermidades crescem continuamente, muitas vezes operando co-morbidades com as biopatias, depressões, outras doenças cardiovasculares e do aparelho respiratório a despeito de toda a tecnologia biomédica desenvolvida para combater tais adoecimentos, explicitando a limitação de lidar com tais sofrimentos.

A despeito de inúmeras legislações e acordos internacionais, como a Declaração de Alma Ata (1978) e os princípios do próprio Sistema Único de Saúde Brasileiro (2003), a saúde majoritariamente é tratada como seu antônimo a “doença” e serve como recurso lucrativo e instrumental. Um estudo realizado em Pernambuco com o título “Contra a desumanização da Medicina” reforça tais evidências (2003).

Sessão de Acupuntura.
A perspectiva biomédica predominante neste modelo, já é continuamente problematizada por inúmeras frentes (Medicina Integral, Saúde Coletiva, Práticas Alternativas, abordagens contemporâneas da Psicoterapia Psicocorporal e Transpessoal, Medicinas Tradicionais do Oriente – Acupuntura e Ayurveda –, Homeopatia, etc). Os avanços no campo de intervenções com fraturas e outras situações emergenciais são inegáveis, porém a fragmentação do sujeito, o abuso da alopatia e a lógica lucrativa pervertem a concepção de saúde, oneram os recursos públicos e reduzem as possibilidades de intervenção, principalmente no campo prioritário da promoção de saúde.

Tem havido crescente interesse no campo da Integralidade e das Práticas Integrativas em saúde. A OMS desde a década de 50 instituiu um grupo de pesquisadores para avaliar tais práticas, passando em seguida a recomendá-la aos serviços públicos de saúde ao redor do mundo por apresentar inúmeros benefícios:

- são menos invasivas (apresentam menos ou nenhum efeito colateral em relação a tratamentos alopáticos);
- menos onerosos (pois demandas menos/ou nenhuma manipulação laboratorial e necessita de menos equipamentos dispendiosos);
- são eficazes em tratamentos em nível primário, e até secundário;
- empoderam os sujeitos que demandam cuidado, distribuindo o poder de cura entre os próprios pacientes;
- aproveita os recursos naturais locais;
- produz outras racionalidades médicas e de cuidado, ampliando o leque de estratégias de atenção à saúde.

Com aumento epidemiológico de doenças ditas “crônicas” e de doenças ocasionadas por hábitos e práticas sociais/culturais (causas externas), bem como a orientação prioritária do SUS na atenção primária, cada vez mais as Práticas Integrativas tem ampliado seu leque de atuação.

Terapia Bioenergética.
A Política Nacional de Promoção da Saúde, a Política Nacional de Humanziação na Saúde e a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, todas elas publicadas na última década, servem de diretrizes e apoio para o desenvolvimento e ampliação de estudos, pesquisas e práticas neste campo.

Bons resultados no cuidado à saúde diante de diversos quadros de adoecimento crônico, bem como na promoção de doenças e agravos por hábitos sociais, fazem de práticas como a Acupuntura, a Homeopatia, a Fitoterapia, a Análise Bioenergética, a Terapia Comunitária estejam ganhando espaço, reconhecimento e visibilidade social.

Na Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), reunimos professores e profissionais de referência na região nestes diversos campos no Laboratório de Estudos, Pesquisas e Intervenção em Integralidade, para que através do exercício cuidadoso da pesquisa, do estudo e da prática localmente orientada, possamos expandir o conhecimento contribuindo para o desenvolvimento deste campo no âmbito local, regional, nacional e internacional.

Projeto Integrar

Confraternização de fim de ano (2010)
dos usuários do projeto.
O Projeto Integrar surgiu da parceria entre a Universidade Federal do Vale do São Francisco e a Secretaria de Saúde do Município de Juazeiro-BA, através do interesse comum entre docentes, estudantes e gestão do serviço em ampliar alternativas de cuidados a população assistida pelos serviços públicos de saúde.

O principal objetivo do Projeto Integrar é contribuir com as práticas de novos cuidados clínicos pautados na integralidade, na promoção de saúde de usuários/as do Sistema Único de Saúde diagnosticados com doenças crônicas.

Privilegiamos atender a população com hipertensão arterial, já que no Município de Juazeiro, segundo informação do Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) da Secretaria Municipal de Saúde no ano de 2010, mais de 11% da população adulta sofre com hipertensão arterial e outras complicações cardíacas. Estima-se que cerca de 70% da população atendida na Atenção Básica, são portadores de doenças crônicas (em especial a hipertensão arterial e diabetes).

Optamos por trabalhar com duas ferramentas novas que se ancoram no paradigma holístico de saúde: a Análise Bioenergética e a Acupuntura.

Drª. Dulce (Médica Cardiologista), Prof. Alexandre (Psicólogo
Clínicoe Dr. Israel (Fisioterapeuta, Acupunturista).
A Análise Bioenergética é uma abordagem psicocorporal desenvolvida pelo Psiquiatra norte-americano Alexandre Lowen na década de 70 (1977; 1982; 1997;), a partir de estudos psicanalíticos, reicheanos e psicossomáticos. Atualmente a Análise Bioenergética é difundida ao redor do globo com sociedades formadas por profissionais da saúde (majoritariamente médicos e psicólogos). Sua técnica já foi ampliada por inúmeros colaboradores que aprofundaram a teoria, bem como sua aplicabilidade em contextos diversos. Em nossos trabalhos do Projeto Integrar adotaremos os Grupos de Movimento (Lowen, 1985; Cañizares, 2002; Rasch e Garcia, 2004; Rasch, 2009;) como recurso metodológico terapêutico. Esta prática consiste na utilização de exercícios expressivos que favoreçam o desbolqueio de tensões musculares provocados pela sobrecarga emocional em regiões localizadas do corpo que afetam o livre fluxo energético dos processos básicos do organismo, respiração, digestão, comunicação. Neste aspecto tais exercícios favorecem a integração do sujeito com seu corpo, sentindo as regiões rígidas, bem como os sentimentos inconscientes inerentes a sua postura corporal que obstruem a saúde. Estes exercícios, junto a grupos de hipertensos têm a finalidade de aliviar a “pressão” interna através da externalização de sentimentos retesados, ofertando conforto e aprendizagem terapêutica.

Profissionais, estudantes de Psicologia e usuários
do projeto na confraternização de fim de ano (2010).
A Acupuntura é uma medicina tradicional chinesa (Maciocia, 1996; 1996a;). Cada vez mais tem havido interesse por este campo em todo ocidente e no Brasil. Recentemente a Acupuntura foi adotada no rol das Práticas de Saúde no SUS, a partir da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde no SUS (PNPIC, 2006), bem como foi legitimado a prática de profissionais de distintas graduações na saúde (medicina, psicologia e fisioterapia) com especialização na área. Sua eficácia no tratamento de inúmeros distúrbios tem sido evidenciada pelo acúmulo das produções científicas, bem como a crescente procura por tais métodos. A concepção energética e holística da técnica faz com que o humano seja compreendido como um todo - a inter-relação entre os órgãos do corpo, as emoções e os elementos básicos da natureza -, ofertando uma anatomia minuciosa (Mao Liang, 2001; Stux e Hammerschilag, 2005) e orientando a compreensão detalhada do adoecimento, bem como as estratégias de cuidado e promoção da saúde.

Nossas atividades ocorrem na comunidade do Alto da Maravilha, em parceria com a Equipe de Saúde da Família local, bem como com o apoio do Centro Comunitário do Bairro. Realizamos atividades semanais e atendemos cerca de 25 pessoas, nos Grupos de Movimento e sessões de Acupuntura.